Quando chega o mês de junho, os supermercados se vestem de São João. As prateleiras se enchem de bandeirolas e, entre elas, um personagem sempre ganha protagonismo: o licor. Seja de jenipapo, tamarindo ou cajá, essa bebida doce e alcoólica é símbolo da festa mais amada do Nordeste. Mas, por trás do aroma marcante e do sabor que remete à infância, há histórias de tradição, afeto e, agora, também de inovação e internacionalização.
No Recôncavo baiano, fazer licor é um ritual passado de geração em geração, nos quintais de casa. E foi justamente nesse cenário que Diego Lemos, diretor da Lemavos, teve o primeiro contato com a bebida. O que era costume de família virou, com o tempo, projeto, pesquisa, linha de produção e indústria exportadora. O nome da marca, aliás, também tem raiz familiar. “Minha mãe é da família Lemos. Fui buscando a origem do nome e cheguei a ‘Lemavos’”, explica.
Com mestrado em Gestão e Tecnologia Industrial e doutorado em Modelagem Computacional, ambos pelo Senai Cimatec, Diego viu no saber popular uma oportunidade de empreender — e aplicar tecnologia para valorizar ainda mais a cultura regional. “Lá atrás, percebi o quanto a produção era artesanal, feita ‘no olhômetro’, sem qualquer medição técnica. A maioria ainda usava prensa de madeira, a mesma de fazer farinha de mandioca”, conta.
Foi assim que, em 2011, surgiu a ideia da Lemavos. A industrialização começou dois anos depois, com apoio da Fapesb, e exigiu dedicação técnica, emocional e pessoal. Tanques, refratômetros, alcoômetros, pH-metros e muito estudo: tudo foi estruturado para garantir padrão, qualidade e respeito ao sabor original. “Mergulhei nesse universo. Fiz cursos, visitas técnicas, estudei desde vinhos até cachaça. Em 2015 começamos com a linha de produção”, lembra Diego.
Para atender todos os públicos, a indústria tem dois tipos de licores, sendo um popular (Sr, Nô) e um premium (Brazeiros). Entre os sabores que mais fazem sucesso estão mel de cacau, limão siciliano e canela, caju, maracujá e outros. Ampliando o mercado, a Lemavos também tem destilados de caju, cacau e jabuticaba em seu portifólio, além de aguardente de melado e rum.

ESG
Os licores da empresa são todos produzidos com frutas compradas diretamente de agricultores familiares e não apenas abastecem o comércio junino, como também têm demanda o ano todo, seja por rede de supermercados, espaços especializados, ecommerce ou na loja da Lemavos em Itacaré, no Sul do Estado, e agora também em Morro de São Paulo.
Com práticas sustentáveis e incentivo à arte e diversidade— que vão desde a mão-de-obra até os rótulos— a empresa já nasceu conectada com os princípios do ESG, e foi além: transformou o resíduo do licor de jenipapo em ração para peixes e camarões, em parceria com a UFSB e apoio do CNPq e da Fapesb.
Europa
E agora, mais um marco: os licores baianos da Lemavos serão exportados para França e Portugal. A conquista é resultado de anos de preparação, com apoio do Centro Internacional de Negócios (CIN) da Federação das Indústrias do Estado da Bahia (Fieb). Através do CIN, a empresa participou de mentorias e consultorias personalizadas que orientaram desde adequações regulatórias até mudanças nos rótulos: detalhe a detalhe.
“Foi uma verdadeira escola. A FarmLab, por exemplo, nos mostrou que até o símbolo de reciclagem precisa seguir o padrão do país de destino. É nesse nível de especificidade que chegamos”, destaca Diego. A exportação é, para ele, apenas mais um passo. Um passo firme, porém, simbólico, de que tradição e inovação não precisam caminhar em lados opostos. Pelo contrário: quando andam juntas, podem transformar uma receita de família em produto global.

CIN
A Lemavos é apenas uma das dezenas de empresas que o CIN apoia ou já apoiou por meio do Programa de Internacionalização, em parceria com o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae). São oferecidas capacitações sobre a temática, assessoria individualizada — que inclui técnica e prática, além da promoção comercial, através da participação em missões empresariais, rodadas de negócios e feiras.
“No programa de internacionalização, a empresa conta com o apoio de profissionais e tradings nas etapas de identificação e abordagem de mercados-alvo, preparação dos produtos e negociação com potenciais compradores. Tudo isso de modo individualizado, pensando na necessidade e demanda de cada indústria”, destaca Patrícia Orrico, gerente de Internacionalização da Fieb.
O CIN atua com diversos segmentos da indústria, a exemplo de alimentos e bebidas, higiene pessoal, perfumaria e cosméticos, além de vestuário, calçados e acessórios, que integram o chamado Origem Bahia. “Nosso trabalho concentra-se em capacitar as empresas, apoiá-las através de um processo de mentoria, buscando justamente aproveitar uma crescente tendência de ampliação de mercados e oportunidades. A aposta é em produtos diferenciados, com qualidade e características próprias, muitas vezes vinculadas ao território de origem e às condições produtivas locais, o que agrega valor e facilita o acesso a mercados em todo o mundo”, explica Orrico.
Ela ressalta que estruturar uma operação internacional não é simples para pequenas e médias indústrias. “É muito difícil para a pequena empresa conseguir estruturar uma estratégia comercial e internacional sem apoio, seja por questões técnicas ou operacionais. Quando estruturamos uma missão empresarial, por exemplo, cuidamos da agenda, da contratação de serviços de tradução, da organização das atividades e das rodadas de negócios no exterior. Nada disso ocorreria sem o suporte técnico e operacional que oferecemos, o que também ajuda a reduzir os custos que cabem à empresa”, completa.
Já o Projeto Viver Bahia inclui indústrias de construção civil, mármores e granitos, tintas, móveis, decoração, cerâmica e revestimentos. “As estratégias de promoção comercial estão diretamente ligadas à demonstração do valor do produto e à criação de uma imagem que reflita sua procedência. Trata-se de um marketing territorial que busca posicionar os produtos baianos de forma estratégica, a exemplo do que já é feito em países europeus, onde a origem é um diferencial competitivo, associado à qualidade, tradição e às características socioeconômicas dos produtores, assegurando uma inserção mais valorizada nos mercados internacionais”, finaliza a gerente.
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