O Instituto Senai de Inovação em Energias Renováveis (ISI-ER) e a Cooperação Brasil-Alemanha para o Desenvolvimento Sustentável inauguram oficialmente, nesta terça-feira (5/9), no Rio Grande do Norte, o Laboratório de Hidrogênio e Combustíveis Avançados (H2CA), fruto de parceria firmada entre os dois países.
A infraestrutura, que consiste na primeira planta-piloto instalada no Brasil para produzir combustível sustentável de aviação (SAF, sigla em inglês para Sustainable Aviation Fuels), vai funcionar no Hub de Inovação e Tecnologia (HIT) do Senai-RN, na capital, Natal. Lá irá ampliar e abrir novos horizontes para a produção e terá, como um dos principais objetivos, o de chegar a um combustível que ajude a reduzir as emissões de gases do efeito estufa no transporte aéreo brasileiro.
“Esta é uma planta-pioloto com maturidade industrial que possibilita passarmos da escala de produção experimental que tínhamos até então para uma escala maior, piloto, permitindo o desenvolvimento de testes e de novos produtos em condições reais de operação industrial”, diz a pesquisadora doutora em Engenharia de Petróleo do Laboratório de Sustentabilidade do ISI, Fabiola Correia, coordenadora do projeto.
“Até outubro deste ano, a expectativa é ter a primeira amostra do combustível para buscar a certificação junto à Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) e apresentar o produto ao mercado”, acrescenta. “Só após a certificação a etapa de comercialização é possível”.
Combustível sustentável
A perspectiva com o Laboratório de Hidrogênio e Combustíveis Avançados é elevar de 200ml/dia para até 5 litros/dia a produção de Syncrude, o petróleo sintético desenvolvido no Instituto Senai de Inovação em Energias Renováveis para ser transformado em SAF.
A capacidade de produção somente do combustível será dimensionada por meio de estudos e experimentos práticos na área. Estudos de viabilidade técnica e econômica também deverão estimar, até o final do ano, o preço do combustível.
O SAF será obtido a partir de glicerina, coproduto da indústria de biodiesel com alto valor energético, mas atualmente subutilizado no Brasil ou exportado com baixo preço de mercado.
A oferta do produto em excesso e o custo reduzido trazem perspectivas de barateamento para o novo combustível, segundo informações da pesquisadora, imprimindo, ao mesmo tempo, valor agregado ao produto.
“O Brasil exporta hoje a glicerina e ainda sobra. Com o projeto que estamos desenvolvendo a ideia é usá-la como matéria-prima do jeito que sai da indústria ou com pré-tratamento, dando a ela uma destinação mais nobre, que agrega valor por meio da produção do combustível, resolve uma demanda ambiental importante e traz soluções à indústria”, frisa Fabiola.
A glicerina para produção do SAF é transformada em gás de síntese por meio de recirculação química – processo em que a matéria-prima é convertida em uma mistura de hidrogênio renovável (H2V) e monóxido de carbono (CO), insumos necessários para a obtenção do combustível líquido.
O gás de síntese é enviado para um “reator de Fischer-Tropsch”, rota tecnológica que tem como vantagem, sobre outras, possibilitar a produção de combustíveis a partir de um número maior de matérias-primas. A partir desse ponto ele é convertido em combustível sustentável de aviação. Na prática, vira Querosene Sustentável de Aviação (QAV).
O projeto H2Brasil, que integra a Cooperação Brasil-Alemanha para o Desenvolvimento Sustentável, investiu mais de 712 mil euros (o equivalente a quase R$ 4 milhões) para que o Laboratório possa produzir QAV sintético.
A iniciativa é fruto de convênio assinado em 2022 entre a instituição e o ISI-ER. Além de apoiar a produção e a aplicação de Combustíveis Sustentáveis de Aviação no país, o objetivo é estudar e avaliar parâmetros operacionais na obtenção de querosene sintético.
O laboratório também deverá operar como unidade de testes para a indústria de aviação brasileira. O QAV produzido, segundo as instituições envolvidas, será certificado pela ANP e terá seus processos otimizados com o tempo para atender as necessidades da indústria.
Metas ambientais
A partir de 2027, o setor aéreo brasileiro terá de reduzir as emissões de carbono de voos internacionais. O gás é um dos vilões do efeito estufa. Hoje, uma regulamentação da ANP já permite a adição de 50% de SAF à composição de combustíveis fósseis (à base de petróleo).
“Os combustíveis fósseis não serão mais admissíveis em breve e a substituição paulatina já é urgente. A International Air Transport Association (Iata) estima que a demanda global por SAF deve saltar de 100 milhões de litros por ano em 2021 para 5 bilhões de litros em 2025. A demanda, portanto, já é enorme, e o Brasil tem potencial muito grande para ser um grande produtor, especialmente o Rio Grande do Norte, estado que tem mais de 80% de sua energia produzida de forma renovável”, diz Markus Francke, diretor do projeto H2Brasil.
Rodrigo Mello, diretor do Senai -RN e do Instituto Senai de Inovação em Energias Renováveis, também ressalta que a busca por fontes de energia limpas tem se intensificado no mundo e que combustíveis avançados, que usam matérias-primas renováveis, como a glicerina, são fundamentais para efetividade da substituição de combustíveis fósseis.
“A aviação internacional está ávida por consumir combustíveis menos impactantes no tocante a gases de efeito estufa e esse projeto vem contribuir diretamente com esse objetivo”, diz ele, acrescentando que “o processo de produção do novo combustível, além da matéria-prima sustentável, usa fontes de energias renováveis”.
“Nós estamos trabalhando intensamente em parceria com o governo alemão e o governo brasileiro contando também com esse diferencial: o Rio Grande do Norte possui, para fornecimento de fonte energética à planta de produção, uma abundante disponibilidade de energia renovável, especialmente a eólica. Então aqui é o momento de juntar os esforços de ampliação de consumo de energias renováveis com os esforços de evolução do tipo de combustível que poderá ser consumido. Certamente o Rio Grande do Norte, que é o maior produtor de energia eólica em terra e que tem grande potencial medido para geração dessa energia também no offshore (no mar), terá uma oportunidade especial de contribuir nesse sentido, com este ambiente de consumo de combustível verde”.
Laboratório é fruto da parceria entre o Instituto Senai de Inovação em Energias Renováveis e a Cooperação Brasil-Alemanha para o Desenvolvimento Sustentável
Parceria
O projeto de produção de Combustível Sustentável de Aviação é executado por meio de parceria entre a Cooperação Técnica Alemã para o desenvolvimento sustentável (na sigla alemã GIZ – Deutsche Gesellschaft für Internationale Zusammenarbeit) e o Senai-RN, que há aproximadamente 10 anos estuda rotas alternativas de produção de hidrogênio – aquelas que não geram emissão de carbono no processo industrial – assim como combustíveis sustentáveis.
A iniciativa é realizada por meio do ISI-ER, com o apoio do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI) e participação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), sob coordenação da professora doutora de Química do Petróleo, Amanda Duarte Gondim, e da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Do Instituto Senai de Inovação em Energias Renováveis, participam do projeto os pesquisadores Fabiola Correia, Juan Ruiz (pesquisador líder do Laboratório de Sustentabilidade do ISI), Giovanny Silva de Oliveira, Daniel Silveira Lira, Tellys Lins Almeida, Ciro Lobo e os bolsistas Matheus Almeida, Marcia Fernanda Teixeira e Paula Fabiane Pinheiro.
Sobre o ISI-ER
O Instituto Senai de Inovação em Energias Renováveis (ISI-ER) é a principal referência do Senai no Brasil em Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (PD&I) em energia eólica, solar e sustentabilidade, incluindo novas tecnologias como o hidrogênio verde.
Está em operação no Hub de Inovação e Tecnologia (HIT) do Senai -RN, em Natal, desde 2018, e foi oficialmente inaugurado em junho de 2021, com a conclusão das instalações e a operação plena dos laboratórios. O Instituto faz parte da maior rede privada de institutos de PD&I criada no Brasil para atender as demandas da indústria, composta por 26 Institutos Senai de Inovação.
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